Se a súa primeira publicación literaria fora o poema “Mariñeiro fusilado” (na revista Nova Galiza, en 1937), Guerra da Cal publicou os poemarios: Lua de além-mar (1959), Poemas (1961), Rio de sonho e tempo (1962) e Motivos do eu (1966).
PÁTRIA*
«Porque volvió, sin regresar, Ulises»
MIGUEL ANGEL ASTURIAS
A Galiza
é para mim
um mito pessoal
maternal e nutrício
com longa teimosia elaborado
de louco amor filial
de degredado
(E de facto é também
-porquê não confes-sá-loum execrável vício
sublimado)
A Galiza
foi sempre para mim
um refúgio mental
um jardim de lembranças
sossegado
um ninho de frouxel acolhedor
para onde fugir
do duro batalhar e do estridor
da Vida
e do acre ressaibo do Pecado
Subterfúgio subtil
e purificador
de interior evasão
para o descanso da alma
na calma
pastoril
da perfeição de Arcádia
da Terra Prometida
da imaginação
A Galiza
é o meu amor constante
tranquila e fiel esposa
e impetuosa amante
sempre
como Penélope a tecer na espera
ansiosa e plácida
paciente e palpitante
do retorno final
do seu errante e navegante Ulisses
-outra quimera!
Amo-a
como o náufrago desesperado
ama a costa longínqua e arelada
que nunca há de avistar
Amo-a
com saudade antevista de emigrado
que à partida se sabe já
a ser ausente morrinhento
de nunca mais voltar
fadado
Porque ninguém jamais regressa do desterro
à mesma terra que deixou
(O Espaço sempre acaba comido pelo Tempo:
Os lugares
e as gentes que os habitam
mudam e morrem sempre
e nós também morremos
e mudamos
Posso eu acaso me reconhecer
naquele rapaz loiro
que chorando partiu
um dia crepuscular e montanhoso
de Quiroga
no Sil
há tantos anos
e tantos desenganos?)
Amo-a
Amei-a sempre
porque nunca deixei
de estar ligado a Ela
pelo umbigo
Porque Ela foi meu berço
e onde quer que eu morrer
Ela há-de ser
o meu íntimo
Amo-te
enfim
Galiza
e último jazigo
coitada, triste e bela Pátria minha
como Tu es
como o Senhor
num mal dia te fez
órfã de história e alienada de alma
vespertina, submissa e maliciosa
rústica e probrezinha
Amo-te
sobretudo
como eu te quereria
como eu em mIm te crio
dia após dia
como um encantamento da minha infância
e da minha fantasia
Amo-te
como eu
tresnoitado poeta evangelista
te invento e mitifico
E, como com Jesus Cristo fez Mateus,
visto com ilusórios véus
a tua miseranda e cinzenta Paixão
e intento
com interna e intensa
distante devoção
pôr-te um nimbo de Glória imaginária
num apócrifo Novo Testamento E. GUERRA DA CAL
ESTORIL,
/984
ERNESTO GUERRA DA CAL e LORCA
Se a súa primeira publicación literaria fora o poema “Mariñeiro fusilado” (na revista Nova Galiza, en 1937), Guerra da Cal publicou os poemarios: Lua de além-mar (1959), Poemas (1961), Rio de sonho e tempo (1962) e Motivos do eu (1966).