martes, 16 de diciembre de 2014

O fogareiro: José Bação Leal

O fogareiro: José Bação Leal



José Bação Leal

As suas poesias foram recolhidas pela mãe, carinhosamente, dos rascunhos que deitava fora. «Sensibilidade nova, exigente e generosa, marcada por uma ânsia radical de verdade.» Assim escreveu Urbano Tavares Rodrigues do poeta que morreu em Nampula (Moçambique) durante a guerra colonial.
O seu testamento («Poesias e Cartas»), descoberto num alfarrabista, é uma das minhas «âncoras». Frequentámos os mesmos cafés (Copa, Mexicana, Império...), partilhámos a mesma angústia (guerra colonial) e a mesma esperança (liberdade).

ORAÇÃO DE VENCIDO

Já se esqueceram as nuvens
A alegria voltou ao rosto das luzes

Os homens do campo
que poderiam ser meus irmãos
são agora estranhas sombras
formulando gestos

Eu vou descendo os degraus da noite
com o passo marcadamente incerto
dos que não sabem perder
e perderam

Caminho em busca da renúncia
com flechas de vento
nas asas da derrota

Levo na cinza dos meus olhos
toda aquela angústia branca
que viceja na espuma dos meus dedos

Por entre pedras e poemas
bêbado e só
eu vou cantando
a minha oração de vencido


José Bação Leal

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