sábado, 15 de octubre de 2016

A Cena do Ódio (completa e legendada - HD) de Almada Negreiros por Mário...



(Fragmento)



Ó esteiras duras pr'a dormir e fazer filhos!
Ó carretas da Voz do Operario
com gente de preto a pé e philarmonica atraz!
Ó campas razas engrinaldadas,
com chapões de ferro e balões de vidro!
Ó bota rôta de mendingo abandonada no pó do caminho!
Ó metamorphose-selvagem das feras da cidade!
Ó geração de bons ladrões crucificados na Estupidez!
Ó sanfona-saloia do fandango dos campinos!
Ó pampilho das Lezirias innundadas de Cidade!
E vós varinas que sabeis a sal
e que trazeis o Mar no vosso avental!
E vós tambem, ó moças da Provincia
que trazeis o verde dos campos
no vermelho das faces pintadas.
E tu tambem ó mau gosto
co'a saia de baixo a vêr-se
e a falta d'educação!
Ó oiro de pechisbegue (esperteza dos ciganos)
a luzir no vermelho verdadeiro da blusa de chita!
Ó tedio do domingo com botas novas
e musica n'Avenida!
Ó sancta Virgindade
a garantir a falta de lindeza!
Ó bilhete postal illustrado
com apparições de beijos ao lado!
Ó Arsenal-fadista de ganga azul e côco socialista!
Ó sahidas pôr-do-sol das Fabricas d'Agonia!
E vós tambem, nojentos da Politica
que exploraes eleitos o Patriotismo!
Maquereaux da Patria que vos pariu...
E vós tambem, pindericos jornalistas
que fazeis cocegas e outras coisas
á opinião publica!
E tu tambem, roberto fardado:
Futrica-te espantalho engalonado,
apeia-te das patas de barro,
larga a espada de matar
e põe o penacho no rabo!
Rálha-te mercenario, asceta da Crueldade!
Espuma-te no chumbo da tua Valentia!
Agoniza-te Rilhafolles armado!
Desuniversidadiza-te da doutorança da chacina,
da sciencia da matança!
Groom fardado da Nêgra,
pária da Velha!
Encaveira-te nas espóras luzidias de sêres fera!
Despe-te da farda,
desenfia-te da Impostura, e põe te nu, ao léu
que ficas desempregado!
Acouraça-te de Senso,
vomita de vez o morticinio,
enche o pote de raciocinio,
aprende a lêr corações,
que ha muito mais que fazer
do que fazer revoluções!
Rebusca no sêres selvagem,
no teu cofre do exterminio
o teu calibre maximo!
acaba de vez com este planeta,
faze-te Deus do Mundo em dar-lhe fim!
(Ha tanta coisa que fazer, Meu Deus!
e esta gente distrahida em guerras!)
Olha os que não são nada por te cantarem a ti!
tantos mundos!
tantos genios
que não fizeram nada,
que deixaram este mundo tal qual!
Olha os grandes o que são, estragados por ti!
E de que serve o livro e a sciencia
se a experiencia da vida
é que faz comprehender a sciencia e o livro?
Antes não ter sciencias!
Antes não ter livros!
Larga a cidade masturbadora, febril,
rabo decepado de lagartixa,
labyrintho cego de toupeiras,
raça de ignobeis myopes, tysicos, tarados,
anemicos, cancerosos e arseniados!
Larga a cidade!
Larga a infamia das ruas e dos boulevards,
esse vae-vem cynico de bandidos mudos,
esse mexer esponjoso de carne viva,
esse sêr-lêsma nojento e macabro,
essess zig-zag de chicote auto-fustigante,
esse ar expirado e espiritista,
esse Inferno de Dante por cantar,
esse ruido de sol prostituido, impotente e velho,
esse silencio pneumonico
de lua enxovalhada sem vir a lavadeira!
Larga a cidade e foge!
Larga a cidade!
Mas larga tudo primeiro, ouviste?
Larga tudo!
--Os outros, os sentimentos, os instinctos,
e larga-te a ti tambem, a ti principalmente!
Larga tudo e vae para o campo
e larga o campo tambem!
--Põe-te a nascer outra vez!
Não queiras ter pae nem mãe,
não queiras ter outros, nem Intelligencia!
E já houve Intelligencia a mais: pode parar por aqui!
Depois põe-te a viver sem cabeça,
vê só o que os olhos virem,
cheira os cheiros da Terra,
come o que a Terra dér,
bebe dos rios e dos mares,
--põe-te na Natureza!
Mas tu nem vives, nem deixas viver os mais,

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